A PRISÃO COMO ESPAÇO RACIALIZADO: VIVÊNCIAS DE CONFINAMENTO DE UMA MULHER NEGRA
DOI:
https://doi.org/10.63330/aurumpub.001-012Palavras-chave:
Mulheres negras, Racismo, PrisãoResumo
O encarceramento em massa de mulheres no Brasil enquanto política criminal de segurança pública - o fenômeno da feminização da punição- tem sido objeto de abordagens sociológicas que apontam para a marginalização de hipossuficientes, em um cenário marcado pela sobreposição de vulnerabilidades. Esta comunicação apresenta uma perspectiva de gênero, com recorte para a temática racial, considerando-se a necessidade de compreensão da constituição da mulher negra em espaços de privação de liberdade. Na perspectiva da interseccionalidade, quer-se entender como práticas de racismo se configuram e se perpetuam no sistema criminal de justiça. O presente trabalho é um fragmento de uma pesquisa social empírica realizada em um presídio masculinamente misto, no interior do Estado do Rio Grande do Sul, com mulheres privadas de liberdade pelo envolvimento com o crime de tráfico de drogas. A partir da análise das relações construídas/constituídas no cotidiano do cárcere, nas dinâmicas prisionais, pretende-se abordar, nas vivências de uma mulher negra, os diferentes racismos por ela enfrentados e denunciados. Trata-se de uma abordagem qualitativa, onde se usa o método biográfico da história de vida que permite dar voz a Quitéria, mulher negra em situação de prisão que conta, significa e ressignifica suas vivências, revelando diversas formas de opressão distintas e concomitantes. Na narrativa da protagonista, nas tramas de afeto e nas relações interpessoais, raça e gênero são marcadores articulados nas suas práticas, que moldam as suas experiências. O cárcere revela-se para Quitéria como um espaço racializado, onde as desigualdades que enfrentava fora dos muros da prisão, são ali reforçadas e reproduzidas, consolidando-se a precarização da existência de quem está em nesse não-lugar.
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